domingo, 17 de maio de 2009

Quem não deixa entrar? Parte 2


“Levai as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo.” Gálatas 6:2

A interpretação equivocada do termo "carga" pode levar aos "césares religiosos" de plantão a achar que essa é uma ordem para se exercer domínio e autoridade sobre convertidos a Cristo por suas pregações ou cristãos não satisfeitos que migram para suas denominações.

A própria carta aos gálatas esclarece qual o cumprimento da lei:

" Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Mas não useis da liberdade para dar ocasião à carne, antes pelo amor servi-vos uns aos outros. Pois toda a lei se cumpre numa só palavra, a saber: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo.Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede não vos consumais uns aos outros." Gl 5:14,15

Servir ao próximo em amor é o que menos vemos do púlpito para o povo. Vemos muito o contrário: homens e mulheres desejosos de serem servidos enquanto exercem o seu papel administrativo-eclesiástico. Parece que as orações e pregações que se fazem em prol dos irmãos devem ser pagas com o "serviço ao reino" por eles (os irmãos).

Estar ao lado de alguém confortando-o, alimentando-o, vestindo-o, pensando e orando sobre soluções para problemas que esse mundo tenebroso impõe às almas cativas por satanás e também aos salvos, é uma carga que pode ser aliviada quando juntamos nossas forças, unimo-nos em amor, criando laços de amizades sinceras, sem críticas destruidoras da paz. Somente pelo fato de estar ali juntos, sem invasão de privacidade, deixando ao outro a confissão , se desejar, de problemas que lhe moem a alma, não lhes imputando qualquer maldição por não fazê-lo, sem expor tal confissão à outrem (nem mesmo disfarçada de "ilustração" como alguns pregadores se deliciam em fazê-lo), traz alivio da carga que cada um tem que levar.

O pastor ou líder deveria ser sábio, instruído, treinado, nessa prática. Mas algo acontece na mente de quem deseja cooperar que lhe foge a visão simples da cooperação mútua e surge o "por quê" do irmão ou irmã estar passando por tal situação. Como ninguém conhece o coração alheio, inicia-se uma peregrinação em busca das razões ocultas. Aquele que pensa descobri-las, se arroga do papel de solucionador e detentor da responsabilidade em "guiar aquelas almas perdidas nos seus erros". É isso que direciona o esforço de interpretações bíblicas ( que os pobres coitados não conhecem) para determinar suas ações religiosas de santificação, adoração, culto, ofertas e dízimos. Conheço "assistência sacerdotal" imposta de tal forma que até a forma como o casal se relaciona na sua vida íntima precisa ser declarada em gabinetes para buscar ali as causas de problemas espirituais.

Antoine de Saint-Exupéry em sua famosa obra “O pequeno Príncipe”, publicada em 1943, e muito lida em todo o mundo na segunda metade do século passado, até certo ponto, contagiou o pensamento reflexivo e paternalista de muitos em nossa sociedade. Entre outros pensamentos, o que muito se proferiu nas décadas de 70 e 80, foi: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas ”. Não obstante seu sucesso, creio que tal declaração não se encaixe com a realidade do Evangelho.

Ninguém é responsável pela salvação de ninguém, mas responsável por suas próprias atitudes e pensamentos. É o testemunho da obra do Espírito de Deus em nós pela fé em Jesus Cristo que edifica a vida de outros que se relacionam conosco.Se tal testemunho atrai as pessoas a Cristo então “permitimos” que entrem no Reino, caso contrário, as afastamos do Reino dos Céus até que outro possa atrai-las para Deus, pois, se Deus a quer, ninguém poderá lançá-la fora. É a esse tipo de impedimento que Jesus repreende ante os fariseus. No entanto tal "permissão" está longe de se comparar com qualquer processo de “visto no passaporte” do candidato a habitante celestial da Nova Jerusalém. Não tem qualquer coisa a ver com o "liga-desliga" que pregam por aí ser uma herança do que Jesus outorgou a Pedro. Isto soa meio romanista, apresenta a sede papal de domínio mundial. Compare Mateus 16:19 com Apocalipse 3:20 e verá que o direito de abrir e fechar "a porta", o acesso ao reino dos céus, pertence exclusivamente a cada um que ouve a voz do Senhor chamar.

“...Não serão mortos os pais por causa dos filhos, nem os filhos por causa dos pais; mas cada um será morto pelo seu próprio pecado.” em 2Rs 14:6, apresenta a responsabilidade individual durante a nossa peregrinação nesse mundo. O sangue de ninguém será cobrado de nossas mãos enquanto não nos comportarmos como aqueles fariseus repreendidos por Jesus. Não serei cobrado pelo que não fiz ou não farei, mas pelo que sou, sabendo que quanto mais somos de Cristo mais fazemos por Seu amor, sem que seja necesário alguém me cobrar isso. O Amor a Deus e ao próximo jamais deixará alguém de mãos vazias. O julgamento das obras anunciado por Paulo aos corintios (3:13) tem mais a ver com o interior do homem, com o que motiva suas ações, do que com a responsabilidade sobre salvação alheia. No capítulo 2 da carta aos romanos, Paulo esclarece a quem cabe tal rsponsabilidade (conf. Rm 2:11-16).

Como o tema “(pré)destinação e eleição” é muito complexo (por causa da consciência) para se tratar num espaço tão pequeno, e isso seja tão desnecessário discutir para vivermos a Verdade, que a abordagem aqui também se faz desnecessária. O que se faz urgente é desenvolvermos a consciência de que nenhum cristão tem qualquer permissão bíblica para “selecionar” os que entram ou não no Reino, mas somente Deus, em Sua soberania é quem determina a escolha (como numa colheita) dos que vão se convertendo verdadeiramente. É isso que entendemos no texto “E cada dia acrescentava-lhes o Senhor os que iam sendo salvos.” At 2:47.

Concluímos que a única responsabilidade que temos é anunciar "a tempo e fora de tempo" o Evangelho do reino. E isso não significa a obrigação de fazer os outros nos ouvirem à força. Se o próprio Jesus "bate à porta" e espera ser convidado a entrar para cear, como podemos nós sermos forçosos no tão abençoado ato de anunciar o Evangelho?

Devemos ser buscadores de oportunidades, recebendo a revelação do Espírito sobre quando,onde e a quem falar e sobre o que tal pessoa necessita ouvir. Isso demonstra que verdadeiramente somos discípulos e não nos enganaremos no "fazer discípulos". Em lugares de reuniões de discípulos, todos ali estão com os corações abertos para ouvir, logo a mensagem deve suprir suas necessidades e não gerar maior carga para levarem para suas casas.

"Não vos preocupeis com o que haveis de falar..." são palavras de Jesus que sossegam nossa alma sobre o que seja necessário fazer em tais situações. Sempre o Espírito Santo nos assiste em nossas necessidades. E isso não significa uma determinação de preparar ou não o sermão da noite; se seguirá ou não regras de homilética ou se o pregador deve ficar "livre no Espírito". Cada um recebe de Deus um dom, que use-o com sabedoria.

Por isso devemos estar atentos para servirmos um ao outro em amor, lançando para longe de nós qualquer pensamento de sujeição da vontade alheia à nossa. Onde habita o Espírito aí há liberdade pois é o Espírito dAquele que é Senhor.

Paz e liberdade no Senhor a todos!

Ocimar

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